Nascida numa geração que se diz ativista e revolucionária, sempre tive muita dificuldade em entender certos comportamentos. Sou de humanas, sou de libra, sou de boas. Fujo do conflito como o demônio corre da cruz e da água benta. Acho justas todas as formas de amor e lido muito bem com a diversidade. De gênero, orientação sexual, religiosa, de opiniões como um todo. Apenas não consigo aceitar a intolerância e o fanatismo, presentes em quase todos os grupos sociais, e que gera muito preconceito, hostilidade e sofrimento pra quem é diferente da maioria em algo.
Com a minha família não poderia ser diferente. Eu era a chata dos almoços de domingo. Quase sempre a única a não gargalhar com as piadinhas preconceituosas de “bicha escandalosa”, “travesti prostituta”, “gorda encalhada” e “pobre fazendo pobrice”, virei a sem graça do rolê. Aquela que levava tudo muito a sério. Que não sabia rir de si mesma. Como se me humilhar fosse ter senso de humor. Não, eu não aceitava isso de jeito nenhum. E era impossível compreender porque a sociedade – acredito eu – está evoluindo em muitos aspectos, mas quem convivia comigo insistia em permanecer com pensamentos retrógrados e parecia não ter saído da década de cinquenta. Se o mundo está mudando, porque não melhorar também? Porque permanecer com uma mente pré-histórica? Qual a necessidade disso?
Foi necessário haver muitas discussões calorosas, brigas homéricas, afastamentos e muita mágoa pra eu chegar a mais óbvia das conclusões: a minha família não vai mudar. E não há quase nada que eu possa fazer a respeito disso. Tive que aceitar pra doer menos. E sabe por quê? Porque o futuro não são eles. Quem está construindo uma nova sociedade e vai colher os frutos dessas mudanças – sejam elas excelentes ou péssimas – é o pessoal da geração y, ou os ainda mais novos. São os meus primos de vinte e poucos, cujo machismo internalizado eu venho ajudando a desconstruir. São as filhas pequenas das minhas amigas, que eu tenho colaborado para empoderá-las e perceberem que o seu cabelo crespo é lindo. São as minhas leitoras jovens, que pedem conselhos por estarem em relacionamentos abusivos e eu consigo convencê-las de que nada na vida é mais importante do que elas. São as pessoas que estão vindo, enquanto as mais velhas estão indo.
A partir do momento em que consegui ter empatia com os mais velhos, deixei de ter tanta raiva das suas ideias e atitudes. Eles cresceram num mundo em que suas crenças e jeito de viver deram muito certo – pelo menos é o que acreditam. E quanto mais tempo você passa com uma crença, fica mais difícil desconstruí-la. Quem seguiu um padrão a vida toda, dificilmente vai mudar. A não ser que aconteça algo muito grande que os levem a, forçosamente, rever os seus conceitos. O tempo e a energia gastos com alguém que certamente vai se aborrecer ao ser apresentado à outras possibilidades é infinitamente melhor investido em conscientizar a galera que está chegando e botando banca agora, e que é muito mais aberta às mudanças.
Demorou, mas eu finalmente parei de bater de frente com a minha família. Não que eu os entenda completamente, tampouco que eu tenha concedido o perdão incondicional à muitas falas que me prejudicaram –a minha vida seria melhor se eu fosse evoluída a tal ponto – mas porque tenho me tornado a mudança que tanto quis ver nos outros. E gastado o meu precioso tempo com quem realmente deseja se tornar uma pessoa mais tolerante, respeitosa e livre de preconceitos.
Ex-concurseira olímpica, amante da escrita e fascinada por relações humanas. Psicóloga para os amigos, não sabe o que fazer com a própria vida. Apaixonada por pessoas consideradas ovelhas negras, com as quais comumente se identifica. Atualmente funcionária pública, está na jornada em busca do seu propósito. Escreve sobre um pouco de tudo em alinexavier.me, no blog Superela e em facebook.com/alineandxavier.
"Eu sou uma buscadora, dando meus passos no universo. Tentando entender, tentando digerir a vida. Eu não quero parar até encontrar de fato tudo o que venho buscando: dar todo o meu amor!"
– Autor desconhecido
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2 comentários. Deixe novo
[…] ♥ Vale a pena bater de frente com as gerações anteriores? […]
Com o tempo, todos nós temos que aprender a ser carne de pescoço com todos! Principalmente com a nossa família!
Na verdade, está certo o ditado que diz que “família só serve pra tirar retrato” (e de quebra, o retrato nunca sai bonito, ficamos horríveis na foto)!
Virar a mesa é importante! Estou com 43 anos atualmente, e só comecei a perceber isso aos 41 anos! Antes tarde do que nunca!
Hoje em dia me encontrei! E, desde que eu não esteja pisando em ninguém, não permito também que ninguém me pise!
Não estou na Terra pra agradar! Só quero viver em paz comigo mesmo! Não quero briga com ninguém, mas sou capaz de tudo pra defender minha LIBERDADE DE ESCOLHA! Quem não sabe defender sua LIBERDADE DE ESCOLHA E PENSAMENTO não merece viver! Essa é a verdade! E quem quiser que durma-se com um barulho desses! Eu deixei de ouvir os ruídos há algum tempo e, nesses últimos dois anos, como tenho melhorado da surdez da minha alma perante os gritos dos outros, e não dos gritos do meu coração!
Não escuto mais nada e nem ninguém, inclusive pai e mãe, ex-mulher, irmãos, amigos (que não servem pra nada, na verdade) e o diabo a quatro! QUE ALÍVIO! COMO FOI QUE NÃO PENSEI NISSO AOS 16 ANOS, MEU JESUS CRISTO? MAS, NÃO IMPORTA! O QUE VALE É QUE AGORA EU SEI!
HOJE SÓ FAÇO O QUE QUERO, E SÓ QUERO PAPO COM GENTE DE CABEÇA AFIM COM MINHA NOVA CONSCIÊNCIA HUMANA!
SER “LOUCO” É ÓTIMO, POIS ESTOU FELIZ AGORA! E ME RIO DEMAIS QUANDO VEJO O QUANTO OS “NORMAIS” PARECEM MAIS COM UM GATO CORRENDO ATRÁS DA PRÓPRIA CAUDA, SEM NUNCA CONSEGUIR AFUNDAR OS DENTES NELA, ENQUANTO QUE EU HOJE SEI AFUNDAR OS DENTES EM TUDO QUE QUERO, MESMO SABENDO QUE OS FRACASSOS SEMPRE ESTARÃO POR AÍ (QUE NOS FAZEM SEMPRE MAIS FORTES, COM CERTEZA)!
QUEM TEM MEDO DO FRACASSO, É PORQUE TEM MEDO DO SUCESSO! A GERAÇÃO ANTIGA FOI CRIADA PRA TER MEDO DO SUCESSO, MAS EU ME RECUSO A CONTINUAR NESSES JOGUINHOS RIDÍCULOS!
SE CHAMAREM, DIGA QUE EU SAÍ! EU NÃO TÔ MAIS NEM AÍ COM PESSOAS QUE TÊM MEDO DE COISAS QUE SÓ EXISTEM NA MENTE DELAS!